sexta-feira, 19 de junho de 2015

NÃO te IMPORTA QUE MORRAMOS?

As barcas não foram construídas para ficar ancoradas na segurança dos portos.

Porque tendes assim tanto medo? 
Deus não está noutro lugar e não dorme. 
Está já aqui, 
está nos braços dos homens, fortes a remar; 
está no timoneiro que se agarra ao leme; 
está nas mãos que lançam fora a água que alaga a barca; 
nos olhos que perscrutam a margem, 
na ânsia que antecipa a luz da aurora.

Deus está presente,mas ao seu modo
quer salvar-me, mas fá-lo pedindo-me que meta em jogo todas as minhas capacidades, 
todas as forças do coração e da inteligência. 
Não intervém no meu lugar, mas ao meu lado
não me livra da travessia, mas acompanha-me na escuridão
Não me guarda do medo, mas no medo. 
Assim como não salvou Jesus da cruz, mas na cruz.
Toda a nossa existência pode ser descrita como uma travessia perigosa,
uma passagem para a outra margem, da vida adulta, responsável, boa.
Uma travessia é iniciar um matrimónio; 
uma travessia é o futuro que se abre diante da criança; 
uma travessia tormentosa 
é tentar recompor feridas, 
reencontrar pessoas, 
vencer medos, 
acolher pobres e estrangeiros.
Gostaria que o Senhor gritasse já ao furacão: cala-te; 
e às ondas: acalmem-se; 
e à minha angústia repetisse: acabou. 
Gostaria de ficar livre da luta, 
mas Deus responde chamando-me à perseverança, 
multiplicando-me as energias; 
a sua resposta é força para a primeira remada. 
E a cada uma, Ele a renovará.
Não te importa que morramos? 
A resposta, sem palavras, é dita pelos gestos: 
importo-me de ti, 
importa-me a tua vida, 
tu és importante. 
Importam-me os pássaros do céu, 
e tu vales mais que muitos pássaros, 
importam-me os lírios do campo, 
e tu és mais belo que eles.
Tu importas-me 
ao ponto de ter contados os cabelos da tua cabeça 
e todo o medo que trazes no coração. 
E estou aqui. 
A fazer-me baluarte e fronteira para o teu medo. 
Estou aqui no reflexo mais profundo das tuas lágrimas, 
como mão forte sobre a tua, entrada em porto seguro.

Ermes Ronchi, acerca de Mc 4, 35-41

Sem comentários: