segunda-feira, 31 de março de 2014

Tantos cristãos parados

«Temos tantos cristãos parados.
Têm uma esperança débil.
Sim, acreditam que existe o céu
mas não o procuram.
Seguem
– observou o Pontífice –
os mandamentos,
cumprem os preceitos,
tudo;
mas estão parados.

E o Senhor não pode extrair deles
o fermento para fazer crescer o seu povo.
Este é um problema: os parados».
 «Depois
 – acrescentou –
há outros, os que erram o caminho.
Todos nós algumas vezes erramos o caminho».
Mas o problema,
explicou
não é voltar
quando nos apercebemos que se errou.

E há depois
«outro grupo que é mais perigoso
– disse –
porque se engana a si mesmo».
São «os que caminham mas não percorrem a estrada:
rodam, rodam como se a vida fosse um turismo existencial,
sem meta, sem levar a sério as promessas.

Aqueles que rodam
e que se enganam porque dizem:
«Eu caminho...».
Não; tu não caminhas, tu rodas!

Ao contrário,
o Senhor pede-nos que não paremos,
que não erremos caminho e que
não rodemos pela vida.
Pede que olhemos para as promessas,
que vamos em frente com as promessas»,
como o homem do evangelho de João,
o qual «acreditou nas promessas de Jesus e se pôs a caminho».
E a fé põe-se a caminho.

Papa Francisco
www.news.va 

quarta-feira, 26 de março de 2014

Primaverar

Uma das formas de conjugar a primavera
é a descoberta que cada um de nós vai fazendo,
a tempo e fora do tempo,
da aliança entre a existência e o inacabado.

Quando, de repente,
tínhamos tudo para nos pensarmos completos,
gastos ou acabados,
descobrimos que a vida é o aberto.

A verdadeira sabedoria,
aquela que nos faz tocar o coração da vida,
é a sabedoria do inicial,
do verde tenro,
do primaveril,
do incessante.

Tem toda a razão a sentença de Lao Tsé:
«Quando ingressam na vida,
os homens são tenros e fracos;
quando morrem são secos e duros.
Por isso, os duros e fortes
são companheiros da morte,
e os tenros e frágeis
são companheiros da vida».

Quando vamos de um lado para o outro
estamos, normalmente,
presos aos motivos que justificam a deslocação.
Mas - temos de reconhecê-lo -
 uma viagem assim é demasiado curta
E não é isso primaverar.

Há uma outra viagem
que só começa quando as perguntas
sobre o que fazemos ali
deixam de interessar.
 Estamos, por final. Viemos.

Não é o saber ou a utilidade que a definem,
mas o próprio ser,
a expressão profunda de si.

A sabedoria dos que primaveram
não consiste, assim,
num conhecimento prévio,
mas em alguma coisa que
se descobre na habitação do próprio caminho.
 José Tolentino Mendonça 
22.3.2014 in Expresso

terça-feira, 25 de março de 2014

Missão País - Ecos de uma Missão

Na semana de 1 a 9 de Fevereiro a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa foi em Missão até Castelo de Vide. Aqui ficam alguns ecos daquilo que se passou nesta semana tão cheia!




In essejota.com

"Ando esquecido, eu próprio, de me tornar jardineiro."

Grande Rui....

Companheiro de outros "jardins"

onde se abriam as mãos

e se apertavam as palavras

noite fora...







A distância do poder



Se há coisa que nos faz sentir distantes de alguém é o poder – nem a luta de classes nos fez perder o desconforto que sentimos quando nos aproximamos de alguém Grande. Fica-se sem jeito; as palavras encravadas no trânsito da timidez; o sorriso grogue de quem está numa terceira margem do pensamento. No final, lá diz o ditado: Mais vale parecer parvo estando calado, do que abrir a boca e confirmá-lo. Mas, se não abrirmos a boca, não estaremos a desperdiçar uma oportunidade de ouvir, a viva voz, o que pensa essa pessoa?



Sou aprendiz de jesuíta e dou aulas numa escola da Companhia de Jesus em Timor Leste. Tenho uma vida normal, em tudo semelhante à vida de muitos professores deste e desse lado do mundo. Embora viva numa terra de Heróis, não costumo tomar o pequeno-almoço com o senhor primeiro ministro Xanana Gusmão. Os heróis com quem convivo são meias-lecas de metro e quarenta, com doze anos de sonhos.



No entanto, há dias tive um encontro imediato. Pediram-me que fizesse chegar uma carta ao gabinete da residência. “E onde é isso?” Na minha cabeça, a tarefa era simples: entrar no carro, atravessar a chuva de Dili, trepar por um monte, esbarrar num muro, dar duas de conversa com um guarda e entregar a dita carta. Nada de camisas, nada de protocolos: serviço de despachante.



Em Dili chovia como previra. O monte, bastante maior e mais íngreme do que mo pintaram, deixou-me o carro aos gritos. E foi então que se deu o encontro. Guinei o volante à direita – a estrada já só terra vermelha – pedindo desculpas ao bólide e eis que, à minha frente, sem muro nem defesas, estava o senhor Presidente da República a regar as plantas do seu jardim.



 Abri o vidro – o carro ainda choroso –, soltei um “Senhor Presidente!” e repeti em jeito de memorando “a camisa, o protocolo”.



 “- Sim, sou eu! Faça o favor de dizer!”



Não fazia ideia do que dizer! Estava tudo dito, ali mesmo. O Presidente a regar as plantas do seu jardim. Um grande homem armado de regador. E eu, o professor, fiquei desarmado – nem a carta me protegeu. O jardineiro olhou-me com a nobreza de quem cuida do crescimento das coisas, e assim mesmo, desprovido de outras muralhas de poder, deixou-me rendido. A memória dos seus feitos de guerra, das suas longas barbas sansónicas de resistente, dos seus discursos enxutos, confirmou-se naquele jardim. Pedi-lhe desculpa, disse que não era minha intenção descobri-lo assim desavisado. A carta pesava agora uma tonelada de timidez e respeito não-dito. Despedi-me do guerreiro das flores e desci – o carro e eu indo calados.



Em Dili chovia já outra chuva. O poder que ali encontrei, tão próximo e vulnerável, trouxe-me uma lição nova. O poder que ali encontrei não foi o de um Presidente nem o de um Guerrilheiro, mas o do homem sábio que se deixou cultivar pelos perfumes da terra e por suas sujidades puras. E se me achei distante dele foi tão somente porque ando esquecido, eu próprio, de me tornar jardineiro. 


Rui Miguel Fernandes, sj
15.02.2014

"RETALHOS DA VIDA DE UM PADRE"


«Na vida de um padre
passam muitas pessoas e
 muitas histórias.
E, nós, padres,
também passamos na vida de muitas pessoas.

Gosto de lembrar histórias. 

Muitas ficaram na memória,
outras, naturalmente,
acabam por se perder e algumas registei,
aqui neste livro,
fosse para não me esquecer fosse para as partilhar.» 
Frei Filipe

(Prefácio)
Escreve D. Manuel Clemente:
«Saúdo (…) os libertadores “retalhos”
que Frei Filipe nos oferece,
em apontamentos ágeis
que resumem dias, meses, alguns anos.
 Da nossa parte, 
a vida só pode ser isso mesmo,apontada. 

Porque o “livro da vida” 
só Deus o tem 
e nos revelará por fim. 

(in livro "Retalhos da vida de um padre")